terça-feira, janeiro 13, 2009

10 anos da maxidesvalorização do Real

Hoje, exatamente no dia 13 de janeiro, estamos "comemorando" os 10 anos da maxidesvalorização do Real frente ao Dólar, data que eu não podia deixar passar despercebida.

Dez anos atrás, o Brasil tentava desarmar uma "bomba-relógio", nas palavras da FolhaNews, montada pouco após o Plano Real. Era a política de bandas cambiais, que mantinha o Dólar quase fixo e havia sido um dos pilares do sucesso do combate à inflação até então, mas que, em janeiro de 1999, parecia ter os dias contados por conta do desequilíbrio nas contas externas e da sangria das reservas internacionais (chegamos a perder cerca de US$ 40 bilhões de janeiro de 1998 até o primeiro trimestre de 1999 - gráfico).

Depois de garantida a reeleição e de perder bilhões de Dólares em reservas, o governo fez então uma maxidesvalorização do real de 8,3%, no dia 13 de janeiro, por meio da hoje folclórica "banda diagonal endógena" do professor Chico Lopes (aquele mesmo, ex-presidente do Banco Central e que responde à processo judicial), que criava um espaço maior de variação do Dólar. O resultado foi um desastre tão grande que a tentativa de controlar a desvalorização durou 48 horas. Em dois meses, o Dólar disparou 73,6%, pulando de R$ 1,21 para R$ 2,10.

Demitido, Chico Lopes foi substituído por Armínio Fraga, que chegou subindo os juros de 29% para 45% ao ano. Eu disse 45% ao ano (nossa Selic terminou 2008 em 13,75%), fazendo aumentar gigantescamente a dívida do governo.

O FHC já admitiu recentemente que um dos maiores erros do seu governo foi insistir em manter o câmbio fixo por tempo demais. E admitiu certo. O custo pro país disso foi extremamente alto, sendo que ele podia já ter feito isso assim que as reservas começaram a se esvair. Mas fazer o quê? A reeleição estava em jogo e como sempre, assuntos políticos foram colocados na frente.

sábado, outubro 11, 2008

O sobe e desce do Dólar

Em épocas de crise financeira como essa, é difícil arrumar algum assunto pra escrever aqui que não seja sobre isso. Ainda mais uma crise de proporções tão devastadoras como está sendo essa. Até o fim dessa semana, as empresas americanas já terão perdido US$ 7 trilhões em valor de mercado (quase 6 vezes o PIB brasileiro), e as empresas brasileiras, outros R$ 1 trilhão. São números tão grandes que são impossíveis de imaginarmos fisicamente.

A velocidade com que o dinheiro circula hoje no planeta e mais o processo de alavancagem faz surgir fortunas e sumir com elas numa piscar de olhos. Mas o que chama mais atenção desses dias é a escalada do Dólar no mundo todo, especialmente no Brasil.

A moeda americana terminou a semana em cerca de R$ 1,31. Até pouco tempo, ela testava o patamar de R$ 1,50 e se comentava sobre um tal fundo soberano para ser gestor da grana que estava sobrando.

O problema é que em crises, as pessoas perdem referências e bate o desespero. Assim, como ninguém sabe o que acontece, fogem pra lugares mais seguros. E os Estados Unidos continuam sendo o lugar mais seguro, por ser a maior economia do mundo e em último caso, se precisar, poder imprimir dinheiro, no caso, o Dólar.

Por isso, os agentes correm pra moeda americana, o que acaba desvalorizando as outras moedas, ou seja, não é um fenômeno apenas aqui. A questão é que pelo que estamos vendo, o Dólar não se sustentaria nesse patamar por muito tempo, por alguns motivos: o fluxo de Dólar em investimento continua entrando no país, ou seja, não há uma fuga gigante de dinheiro do Brasil; o Banco Central tem dinheiro suficiente para conter uma alta maior por conta das reservas; o Dólar mais alto breca as importações momentaneamente, o que acaba beneficiando nossa balança comercial (embora o efeito não seja tão imediato). É por isso que há a perspectiva da moeda americana cair nas próximas semanas. E o Dólar desvalorizado não é tão ruim assim: favorece as vendas externas do país lá fora e acabou por fazer o Banco Central ter um lucro de mais de US$ 6 bilhões já que o país zerou a dívida externa e passou a ser credor externo.

E por último, uma questão importante é que o sistema bancário do Brasil não está fragilizado como os estrangeiros. Aqui as regras são mais rígidas e o sistema de crédito imobiliário aqui é diferente dos Estados Unidos. Isso dá uma certa tranquilidade. É claro que vamos ser afetados por conta da restrição de crédito internacional e a queda da atividade econômica nos países, mas temos condição de mostrar a força do nosso mercado interno nesse momento, que desde 2003 tirou 20 milhões de pessoas da pobreza.

quarta-feira, setembro 17, 2008

Faça o que eu digo, não faça o que eu faço

John Maynard Keynes deve estar rindo, onde quer que esteja. Keynes foi um dos economistas mais importantes da história. Foi ele quem defendia a idéia da intervenção do Estado na economia, ou seja, idéia totalmente contrária daquela que os Estados Unidos e seus formuladores de política sempre defenderam. As receitas neoliberais especialmente dos anos 90, para países em desenvolvimento, sempre foram baseadas em preceitos opostos ao que Keynes defendia.

Milton Friedman, por sua vez, foi um dos baluartes do liberalismo. Foi o maior advogado do neoliberalismo econômico e da subseqüente redução das funções do Estado frente ao domínio do mercado livre. Porém, Friedman disse algo sábio em 1965: "diante de crises, somos todos keynesianos".

Não deixa de ser emblemático. Com a crise gigantesca nos Estados Unidos que culminou essa semana com a quebra do quarto maior banco de lá, o governo foi obrigado a intervir. Gastou nada mais do que US$ 200 bilhões de dinheiro público salvando dois bancos hipotecários e hoje veio a notícia de que aportou mais US$ 85 bilhões na AIG, maior seguradora americana, e estatizou-a. Ou seja, mais uma vez dinheiro público usado para salvar empresa privada.

Independente de qualquer outra coisa, quando um Hugo Chavez ou afins realiza uma estatização, é um carnaval total em cima. Por outro lado, todos se ajoelham diante da ajuda estatal na terra do tio Sam, terra do suposto livre mercado. Dias irônicos esses, cujos desdobramentos parecem que demorarão a terminar tão cedo.

quinta-feira, setembro 11, 2008

Da série: como abortar o crescimento do país

Dia 10/09

De manhã:
PIB brasileiro cresce 6,1% no segundo trimestre em comparação com o mesmo trimestre do ano passado.

De noite:
Banco Central aumento o juros em 0,75 p.p. passando a 13,75% a.a., quarta alta seguida.

E assim, o país vai crescendo de teimoso.

sexta-feira, agosto 29, 2008

A cara de pau do presidente do Banco Central

Hoje saiu uma declaração na mídia do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, dizendo que o aumento dos juros já surte efeito.

Vejamos as palavras: "A boa notícia é que o processo está funcionando e já estamos vendo os sinais de que a inflação está convergindo para o centro da meta", depois de aumentar os juros por conta de uma suposta demanda doméstica aquecida e choque das commodities sobre a inflação.

É um mentiroso. Primeiro porque quem acompanha o mercado sabe que a subida da SELIC só tem efeito prático na economia depois de, no mínimo, 8 meses. Segundo, é que o referido presidente insiste em usar a "demanda doméstica aquecida" pra aumentar os juros.

Ora, não há sinais de descompasso entre oferta e demanda, inclusive os indicadores da FGV e da FIESP de capacidade ociosa estão passando por formulações para provar que ainda existe um nível bastante importante de produção até atingirmos um limite crítico. Outra coisa, aumento de juros não faz a população comer menos: as vendas de varejo e supermercados no país tiveram aumento de dois dígitos até esse momento, o que faz desabar por terra qualquer tentativa de convencimento de que aumentar juros vai frear o consumo nesse sentido.

A inflação deu uma trégua porque o petróleo voltou a cair, por conta da sensação mundial de menor demanda do produto com a desaceleração nos EUA e resto do mundo. Além disso, os alimentos também tiveram queda e é por isso que nossos índices de preços estão voltando a se comportar. Portanto, Meirelles, não adianta vir falar que foi o causador da volta da inflação ao centro da meta porque não foi. Não haveria aumento de juros internos capaz de freiar uma inflação mundial advinda de fatores tão díspares como efeito climático, aumento do consumo chinês e choque do petróleo.

terça-feira, agosto 26, 2008

Olimpíadas 2008

Estive ausente bastante tempo aqui do blog por causa de 1) falta de vontade de comentar certas coisas e 2) Olimpíadas. Mas falemos da última.

A Olimpíada é uma ótima oportunidade de vermos o quanto o mundo pode ser ao mesmo tempo fantástico e desigual. É o espelho da nossa humanidade, ali, num mesmo lugar, competindo durante duas semanas.

É uma festa diretamente ligada ao espírito nacionalista de quem a promove e serve como uma espécie de trampolim ou legitimidade para nações que almejam algum respeito mundial. Afinal, no jargão, a cidade sede vira uma espécie de "capital do mundo".

É por isso que países emergentes se estapeiam para conseguir promovê-la, incluindo Coréia do Sul em 1988 e China agora, 20 anos depois. O Brasil não fez tão feio dessa vez, conquistou 15 medalhas, sendo 3 de ouro em esportes que nunca havíamos chegado a tal pódio. De todos os esportes que realmente tínhamos chances, acabamos trazendo medalhas praticamente em todos eles.

Mas voltado à questão da sede, será que o país precisa disso? Se for pra tentar conquistar algum respeito, sim. Além disso, uma festa dessa mexe com o povo todo, incluindo seu orgulho. O povo daqui, pelo que eu andei lendo, além de não confiar na capacidade do Brasil sediar um evento desse, não estaria animado para tal. Porém, o Pan não foi um fracasso, embora em termos de escala, estejamos bem abaixo de uma Olimpíada.

O fato é que das cidades finalistas, Madri, Tóquio, Chicago e Rio de Janeiro, acredito que Chicago seja a eleita. Não só por conta de uma espécie de rodízio de continentes (Ásia em 2008, Europa em 2012), mas também porque eu ainda acho que não é a vez do Rio. Veremos dia 2 de outubro de 2009, quando for divulgada a cidade.

terça-feira, julho 29, 2008

Doha a quem doer

O ano de 2001 foi bem marcante pra história de um modo geral. Muitos o consideram marco da entrada ao século 21, assim como o final do século 20 seria a queda do Muro de Berlim. Marco por conta dos atentados de 11 de setembro: pela primeira vez, o império dominante era atacado dentro de seu próprio território e o que é pior, por um inimigo invisível, dando início à paranóia coletiva que o terrorismo traria posteriormente. Mas o ano de 2001 também ficou marcado pelas negociações sobre comércio, a chamada Rodada de Doha. Realizada dois meses depois dos atentados, talvez por obra da auto indulgência, nunca os países desenvolvidos haviam se dispostos a tanto se comprometido a tanto em termos de liberalização do próprio mercado até então.

A intenção declarada da rodada era tornar as regras de comércio mais livres para os países em desenvolvimento, incluindo as vertentes agrícolas e industrais/serviços na pauta. O problema é que as reuniões ocorridas depois acabaram dando em nada.

Hoje, foi anunciado o fracasso de mais uma dessas reuniões para se chegar a um consenso. Países como China, Índia e Brasil querem dos países desenvolvidos acesso maior aos seus mercados agrícolas. A Europa gasta bilhões por ano em termos de subsídios para seus agricultores, o que acaba gerando distorções no comércio mundial, assim como os Estados Unidos. Por outro lado, os desenvolvidos exigem maior abertura dos em desenvolvimento na questão industrial.

Hoje, pelas regras da Organização Mundial do Comércio, o país pode aplicar no máximo 35% de imposto de importação à produtos industriais, a fim de proteger sua indústria. O Brasil usa a alíquota máxima, por exemplo, para a importação de carros, desde que fora de países que o país tenha algum tipo de acordo de livre comércio, como é o caso do México, por exemplo.

Portanto, sem abrir mão de alguns pontos, é improvável que a Rodada de Doha tenha algum sucesso. Lá se vão sete anos sem um acordo definitivo fechado.

Os grupinhos de negociação da Rodada de Doha:

G-10
Este grupo reúne grandes produtores agrícolas que impõem elevadíssimas tarifas alfandegárias a produtos considerados vitais para seus agricultores, como o Japão (778% a suas importações de arroz). É o grupo dos ultra protecionistas. Rejeita a proposta que determina máxima de 100% para estas tarifas, como pede outros países.
Membros: Coréia do Sul, Ilhas Maurício, Islândia, Japão, Liechtenstein, Noruega, Suíça, Taiwan, Bulgária e Israel.

Grupo de Cairns (17 membros)
Este grupo reúne grandes exportadores agrícolas, industrializados ou em desenvolvimento, todos contrários aos subsídios e aos incentivos da União Européia e dos Estados Unidos a seus agricultores.
Membros: África do Sul, Argentina, Austrália, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Indonésia, Malásia, Nova Zelândia, Paraguai, Filipinas, Tailândia, Uruguai.

G-20 (21 membros)
Este grupo inclui países emergentes, liderados pelo Brasil e pela Índia, que são contra as políticas agrícolas dos países ricos. Porém, está dividido sobre os produtos industriais, entre exportadores livre-cambistas (como Brasil) e países mais protecionistas, como a Índia.
Membros: África do Sul, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, China, Cuba, Egito, Guatemala, Índia, Indonésia, México, Nigéria, Paquistão, Paraguai, Filipinas, Tailândia, Tanzânia, Uruguai, Venezuela, Zimbábue.

PMA (32 membros)
O grupo de Países Menos Avançados da OMC não devem, em princípio, fazer concessões nas negociações, mas temem ficar marginalizados pelo desenvolvimento de nações como a China e o Brasil.
Membros: Angola, Bangladesh, Benin, Burkina Faso, Burundi, República Centro-africana, Chade, Djibuti, Gâmbia, Guiné, Guiné-Bissau, Haiti, Ilhas Salomão, Lesotho, Madagascar, Malawi, Maldivas, Mali, Mauritânia, Moçambique, Mianmar, Níger, República Democrática do Congo, Ruanda, Senegal, Serra Leoa, Tanzânia, Togo, Uganda, Zâmbia.

G-33 (42 membros)
Este grupo é integrado por países em desenvolvimento que defendem o conceito de "produtos especiais", importante para suas agriculturas, e pelos que pedem a manutenção de um nível maior de proteção.
Membros: China, Congo, Coréia do Sul, Costa do Marfim, Cuba, Haiti, Honduras, Índia, Jamaica, Panamá, Peru, República Dominicana, Trinidad e Tobago, Turquia, Venezuela.

ACP (56 membros)
O grupo África-Caribe-Pacífico reúne a antigas colônias que querem conservar um acesso preferencial ao mercado europeu e acabam sendo contrários a certas posições do G-20.
Membros: África do Sul, Angola, Antígua e Barbados, Bermuda, Belize, Benin, Botsuana, Burkina Faso, Burundi, Camarões, República Centro-Africana, Chade, Congo, Costa do Marfim, Cuba, RD Congo, Djibuti, Dominica, República Dominicana, Fiji, Gabão, Gâmbia, Gana, Granada, Guiné, Guiné-Bissau, Guiana, Haiti, Jamaica, Quênia, Lesoto, Madagascar, Malawi, Mali, Mauritânia, Ilha Maurício, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, Uganda, Papua Nova Guiné, Ruanda, São Kitts e Névis, Santa Lúcia, St Vincent e Granadinas, Senegal, Serra Leoa, Ilhas Salomão, Suriname, Suazilândia, Tanzânia, Togo, Trinidad e Tobago, Zâmbia, Zimbábue.

G-90
Este grupo é uma estrutura mais informal, integrada pelos países ACP, as nações da União Africana e os Países Menos Avançados (PMA).